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Nathalie Moellhausen: 'Quando coloco a máscara, mostro quem realmente sou'

2024-07-27     HaiPress

Nathalie Moellahusen — Foto: Divulgação

*Esgrimista,em depoimento à repórter Carol Knoploch

Os Jogos Olímpicos de Paris vão marcar a minha aposentadoria do esporte de alto rendimento,mas não da esgrima. Eu sou a única esgrimista,posso garantir,a casar este esporte com a arte,o entretenimento,a dança e até a usá-lo como ferramenta de autoconhecimento. No ambiente da minha modalidade,sou conhecida como A Mulher Mascarada. E é assim que quero que me reconheçam fora dele também. Por muitos anos,pensei que a máscara tinha apenas a função protetora. Tem,de fato. Mas,fora do esporte,a máscara é catártica.

Pare e pense: vivemos numa sociedade em que todos se expõem,principalmente nas redes sociais. Mas tudo o que se mostra é verdade? Ninguém está vestindo máscaras? Sei que o termo tem conotação pejorativa,mas gosto de vencer estereótipos.

Vejo a máscara de uma maneira completamente diferente do senso comum. Na esgrima,quando a coloco e entro para um combate,é quando mostro quem realmente sou. É o meio que me permite ser eu mesma. Desde que vesti uma máscara de esgrima pela primeira vez,aos 5 anos,não a tirei mais. Só fui trocando... Carrego até hoje a lembrança. Era tímida e me “enxerguei” por trás da máscara,ficava horas treinando no meu mundo particular. Agora,quero transmitir esse outro lado,o artístico,de leveza e liberdade.

Fora do esporte,quando estou de máscara é quando me sinto mais mulher e feminina. É quando ultrapasso limites. Já me disseram,e é verdade: não tenho filtro. Parece irônico,porque sempre estou de máscara.

Eu gosto de sair pela rua mascarada. Amo encontros “mask to mask”,em que os participantes não tiram as máscaras. Uso a máscara sempre que posso e em várias situações. Os momentos que mais me divirto são os momentos em que estou com ela.

Tenho uma coleção de cerca de 300 máscaras. As de competição têm a bandeira do Brasil. E as artísticas têm desenhos,frases,obras de arte... Tem dias em que acordo com uma ideia e tenho de anotar. Hoje,a minha preferida é a dourada,com uma ruptura no meio — uma associação com a cultura japonesa que diz que é possível reconstruir uma fissura com ouro,reparar feridas com ouro. Minha coleção mora comigo.

Nathalie Moellhausen: 'Quero transmitir esse outro lado,de leveza e liberdade.' — Foto: Nika Gunchak/Divulgação

Já fiz várias coisas malucas usando máscara. Dei palestra para advogados,em um ambiente sério. Cheguei de máscara e sem medo. Em um desfile de moda,muita gente pensou que se tratava de uma parte do show da marca. No Dia das Mulheres,fiz uma performance com uma máscara com tela de lingerie. E também já fui jantar,em um date,e cheguei ao restaurante mascarada. Sei que conquistei aquele coração. A máscara tem esse poder.

Acredito que somos muitas mulheres,todos os dias e em vários momentos. E podemos usar várias máscaras. Não é uma questão de ser feminista. Sou mulher,feminina. E temos o direito de ser várias pessoas,em várias situações. Não precisamos expressar apenas um lado do que somos. Ninguém é apenas uma versão de si mesmo.

Neste ciclo olímpico,o meu de despedida,eu quis aproveitar,curtir,ser feliz... Mas sem perder o foco nos compromissos com treinos e competições. Quis viver intensamente cada ano,cada dia. Não poderia ser mais significativo me despedir da esgrima em Paris,cidade que escolhi para morar aos 17 anos.

Nesse clima,fui para rua com máscaras diferentes. Sempre faço isso,é verdade. Mas quis registrar esses momentos. Teve a briga do Medo e do Amor,e ainda uma homenagem aos Jogos. Dancei nas ruas,visitei lugares-ícones... E a reação das pessoas foi incrível. Teve gente que saiu dançando comigo.

Isso aproxima,democratiza a utilização da máscara e deixa o esporte mais popular. Tenho uma missão como atleta brasileira,mas sobretudo de ser uma embaixadora internacional desta arte. O que quero dizer é que minha missão também é social,artística e filantrópica.

Nathalie Moellhausen: 'Minha missão também é social,artística e filantrópica' — Foto: Nika Gunchak/Divulgação

A competição olímpica da esgrima será no Grand Palais,local de grandes desfiles de moda e eventos. Foi aqui que conquistei a primeira medalha em um Mundial,um bronze,em 2010,pela Itália. E também onde começou minha carreira de diretora de arte. Tinha 24 anos e,em paralelo com os treinos,organizei a festa de abertura da competição.

Neste mesmo local,fui diretora de arte da cerimônia de gala do centenário da Federação Internacional de Esgrima,em 2013 — um acontecimento importantíssimo,com show do Sting. Era uma oportunidade única. Não pude recusar o convite. Cinco anos depois,nesta mesma festa de gala,fiz uma exposição com minhas máscaras e uma performance com grupos mascarados.

Sempre trabalhei as duas carreiras em paralelo para ter,após a vida esportiva,um segundo round com a esgrima. Mas,para as pessoas perceberem que não sou apenas atleta,demorou três anos. Demorou,mas aconteceu. Tenho um grupo forte ao meu lado na 5Touches (empresa de Nathalie) e que está louquinho para colocar na rua tudo o que idealizamos para esta nova etapa.

Sei que tudo o que construímos veio dos resultados no esporte,mas também porque Paris transpira arte. Conheci a cidade pela primeira vez aos 15 anos,com duas amigas. Na época,adorava música,tocava violão e estava numa fase hippie,feliz da vida. Paris para mim era o filme da Amélie Poulain: mágica,poética. Não imaginava que moraria aqui. Foi um acaso,como as situações vividas pela Amélie.

Daniel Levavasseur,um treinador francês e que trabalhou com a Laura Flessel,grande esgrimista que tem cinco medalhas olímpicas,sendo duas de ouro,havia criado uma academia internacional. E estava treinando estrangeiros. Ela era meu ídolo,e tive a oportunidade de treinar com Levavasseur. Seriam seis meses. Acabei ficando a vida toda.

E que privilégio acompanhar de perto a transformação da cidade para os Jogos! Minha preparação seguiu seu rito ao mesmo tempo em que Paris se preparou para receber o evento. Vi obras começarem e terminarem e fui acompanhando seu dia a dia. Ao mesmo tempo,estava avançando no meu dia a dia,nas minhas construções.

Minha conexão com Paris cresceu ainda mais neste ciclo olímpico. E quero poder acrescentar um capítulo ápice à nossa história: a conquista da tão sonhada medalha olímpica. Se acontecer,é certeza que vou pensar em uma máscara para representar esse momento. Para a nossa mais importante união.

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