No Brasil,duas doses diárias para o público masculino e uma para o feminino é o considerado consumo moderado. — Foto: Carl Godfrey / The News York Times
GERADO EM: 17/10/2024 - 04:30
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Nos últimos anos,houve um aumento nas mortes relacionadas ao álcool e uma onda constante de notícias sobre os riscos à saúde do consumo de bebidas alcoólicas. Os apelos para que as pessoas bebam apenas com moderação tornaram-se mais urgentes. Mas o que,exatamente,isso significa?
— Brincando,as pessoas definiram isso como não beber mais do que o seu médico — diz o cientista Tim Stockwell,do Instituto Canadense de Pesquisa sobre o Uso de Substâncias.
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Oficialmente,nos Estados Unidos,o consumo moderado de álcool é definido como uma dose ou menos por dia para mulheres e até duas doses por dia para homens,assim como no Brasil. Mas outros países definem o consumo moderado,também chamado de consumo de baixo risco,de maneira diferente,e pesquisas recentes sobre os danos à saúde relacionados ao álcool levantaram questões sobre as diretrizes atuais.
Especialistas costumavam pensar que quantidades baixas ou moderadas de álcool eram benéficas para a saúde. Essa suposição era baseada em pesquisas que mostravam uma longevidade maior de pessoas que bebiam moderadamente em comparação a quem se abstinha ou bebia excessivamente. O benefício em termos de longevidade desaparecia em cerca de duas doses por dia para mulheres e três para homens,de acordo com Stockwell.
Mas muitos pesquisadores agora acreditam que essas conclusões foram baseadas em análises de dados que tinham "todos os tipos de problemas metodológicos",argumenta a professora de nutrição e medicina,Elizabeth Mayer-Davis,da Universidade da Carolina do Norte.
Por exemplo,um problema era que muitas pessoas que se abstinham do álcool o faziam porque já tinham problemas de saúde,enquanto as pessoas que bebiam moderadamente eram mais propensas a ter hábitos de vida saudáveis. Isso criou "uma ilusão de benefícios à saúde com quantidades baixas a moderadas de álcool",diz Mayer-Davis.
Um novo método para estabelecer risco foca apenas nas mortes por condições diretamente relacionadas ao álcool,como cirrose hepática,intoxicação alcoólica,pancreatite e certos tipos de câncer.
— É muito menos tendencioso e confuso se você se concentrar apenas em condições causadas pelo álcool — revela Stockwell.
Usando esse método,os especialistas descobriram que o consumo de baixo risco envolve menos álcool do que o que muitos países,incluindo os Estados Unidos,atualmente recomendam. Mas o nível preciso em que o consumo de álcool começa a prejudicar a saúde,e o que é considerado um nível aceitável de risco,ainda está em debate.
Alguns países ajustaram suas recomendações. Austrália e França agora aconselham que ambos os sexos não consumam mais de 10 doses por semana. (Isso representa uma redução em relação às duas doses por dia para homens e mulheres,recomendada anteriormente na Austrália; e três doses por dia para homens,e duas para mulheres,na França). As diretrizes mais recentes do Canadá,nas quais Stockwell participou,são mais rigorosas: o consumo de baixo risco é definido como não mais do que duas doses por semana,independentemente do sexo.
Para as diretrizes americanas mais recentes,emitidas em 2020,um comitê consultivo liderado por Mayer-Davis recomendou que homens e mulheres consumissem não mais do que uma dose de bebida alcoólica por dia. Essa orientação incorporou as pesquisas mais recentes que mostraram que "não havia quantidade de álcool que beneficiasse a saúde," diz a médica.
— Mas não vamos tão longe a ponto de dizer que todos precisam parar de beber,porque isso não é realista — acrescenta.
O Departamento de Agricultura e o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA,que definem as diretrizes oficiais,rejeitaram o conselho do comitê. Quando questionados por que,um representante do Departamento de Agricultura afirmou em um e-mail que "as evidências emergentes mencionadas no relatório do comitê não refletem a preponderância de evidências neste momento". O próximo conjunto de diretrizes alimentares está programado para ser divulgado em 2025; ainda não se sabe se,e quanto,elas mudarão.
Apesar da tendência de estabelecer um limite único para ambos os sexos,alguns especialistas dizem que ter diretrizes separadas faz sentido.
Isso porque é necessário menos álcool para afetar negativamente a saúde das mulheres do que a dos homens,incluindo um maior risco de danos ao fígado relacionados ao álcool,doenças cardíacas e certos tipos de câncer,afirma Aaron White,conselheiro científico sênior do diretor do Instituto Nacional sobre Abuso de Álcool e Alcoolismo dos EUA.
Parte desse risco maior pode resultar de diferenças de tamanho. Mas mesmo que "uma mulher e um homem da mesma idade e do mesmo peso bebam exatamente a mesma quantidade de álcool,a mulher terá uma concentração de álcool no sangue mais elevada do que o homem",explica Sherry McKee,diretora do Programa de Yale para Diferenças Sexuais no Transtorno por Uso de Álcool.
Uma razão potencial para isso é que o álcool não entra no tecido adiposo,e as mulheres tendem a ter uma proporção maior de gordura do que os homens. Isso significa que há menos espaço para o álcool se distribuir pelo corpo,resultando em concentrações mais altas. As mulheres também não metabolizam o álcool tão facilmente quanto os homens,portanto,mais álcool permanece em seus corpos por mais tempo,o que pode resultar em mais danos.
As mudanças e inconsistentes recomendações podem "frustrar bastante o público",argumenta Mayer-Davis.
— Mas isso é o melhor que podemos fazer,que é fazer recomendações baseadas na ciência com a literatura e o conhecimento disponíveis.
Embora os detalhes permaneçam indefinidos,há uma coisa com a qual a maioria dos especialistas concorda.
— Menos é mais; menos é melhor — diz Stockwell. — Beba menos; viva mais.